domingo, 3 de fevereiro de 2008

Como se fosse a vida real
Por Seth Kugel

Construir, decorar, comprar... Parece tudo de verdade no Second Life.

Do deck no topo da vila em estilo mexicano de Sherman Ochs, vê-se, abaixo, a ilha de Jalisco, com seus 20 habitantes. É um lugar pitoresco, com palmeiras, gramados e céu sem nuvens. E há praias ao redor da lagoa, onde os moradores douram os corpos em um NCL - Naked Conga Line. Não é real, naturalmente: Ochs é Don Ainsworth, um professor de música aposentado de 57 anos que mora em Ventura, Califórnia. Jalisco é um sim (simulador), um enredo do Second Life, mundo virtual introduzido na internet em 2003 pelo Linden Lab, de São Francisco.


Mas também não é tudo falso. A vida em Jalisco, onde as visitas de vizinhos são comuns, parece a de uma comunidade real. Muitos residentes conhecem seus vizinhos na vida aqui fora e, algumas vezes, conversam na internet ao operar seus avatares - o personagem que os representa no tridimensional Second Life.

Os milhares de participantes podem teletransportar-se à vontade, transformar-se em dragões e mudar de aparência com poucos cliques do mouse. Eles constróem cidades, criam linhas de roupas, programam seus avatares, montam a cavalo, dançam e fazem sexo. Mas muitos parecem desejar mais que realizações mundanas. Após dançar nos clubes e atuar como criaturas de O Senhor dos Anéis, eles sossegam depois de uns meses: passam a projetar casas, criar jardins, comprar móveis e eletrônicos, além de decorar.

Decoração virtual

O Linden Lab não controla a quantidade de casas construídas nos mais de 12 mil sims da Second Life, ou quantos participantes possuem e moram em casas. Mas o número está perto dos milhares, de acordo com Catherine Smith, porta-voz da empresa. É difícil saber a quantidade de usuários, pois uma pessoa pode ter múltiplas contas, mas sabe-se que existem 8,6 milhões de contas.

“Enraizar-se é importante para um muita gente no Second Life”, diz Catherine. Para alguns, as casas online representam o estilo Architectural Digest de suas fantasias. De fato, o Second Life tem agora sua revista de decoração, Prim Perfect, publicada por um participante, que mostra sofisticadas residências do mundo virtual. Mas, para outros, como a maioria dos moradores de Jalisco, uma casa é um lugar para relaxar, receber amigos e experimentar a decoração.

Era junho quando o avatar de Ainsworth, um cabeludo loiro e rebelde com pêlos no peito insinuando-se através da camisa havaiana desabotoada, decidiu construir uma “casa” após meses de dolce far niente. “Eu estava flanando pelo Second Life”, explicou numa entrevista em sua casa virtual em Jalisco, concedida a Don Camil Rodenberg - o avatar deste repórter -, identificado como jornalista do The New Yor Times. “Não me importa um local para chamar de lar. Mas, depois de um tempo, pareceu boa idéia.”

O Second Life oferece todos os tipos de regiões para escolha, incluindo A’ksha Caves, uma área desértica com residências depropriedade da megaempresária Ansh Chung (avatar de Ailin Graef, empreendedora chinesa que ganhou US$ 1 milhão real no Second Life) e o sim Veneza.

Ilhas como Jalisco compreendem mais de 9 mil sims e outros milhares de simuladores distribuem-se em poucos continentes. Jalisco é o lugar ideal para Ainsworth. “Tem um pessoal amigável e de classe”, afirma. Em parte, graças às leis de zoneamento restritivas da “convenção” da ilha, que exigem a manutenção do tema mexicano nas construções, e também à atenção dedicada ao sim e seus residentes por Rooby - ou melhor, sua criadora, Brenda Veach, 46 anos, de Issaquah, Washington, que passa oito horas por dia no Second Life. Além de desenvolver a ilha (ela pagou US$ 1.200 ao Linden Lab por seu controle), atua como prefeita e diretora de cruzeiro, fazendo cumprir regras e convidando os locais à socialização.

Os direitos de um terreno em Jalisco, na praia, custam cerca de 55 mil Linden dólares (a moeda virtual), o equivalente a US$ 200. Depois são gastos de US$ 25 a US$ 40 por mês para a taxa de condomínio do Linden Lab. Um lote em outra ilha virtual pode valer menos de US$ 20. Decorar casas é bem mais barato - uma mesa, por exemplo, sai por US$ 1 ou US$ 2, ou até por centavos. A casa de Ainsworth, um modelo pré-fabricado que veio com o terreno, foi comprada por Brenda, da Fisher Construction, uma “construtora” do Second Life, por cerca de 1.400 Lindens, pouco mais de US$ 5.

Origem: O Estado de São Paulo.

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