sexta-feira, 12 de outubro de 2007

Revista Veja: Minha vida como pingüim

As versões infantis dos mundos virtuais são até mais inventivas do que as dos adultos.

Elas são exemplos acabados de uma nova geração de crianças. Chegam da escola, dão uma volta no shopping, emendam com o jantar numa pizzaria e, se da maratona ainda sobra algum fôlego, vão a cinemas e livrarias. Mas nada disso se passa no mundo real. Os passeios são feitos em universos virtuais nos quais as crianças vivem pela internet situações que simulam a realidade, sempre representadas por um personagem que elas próprias criam. Os personagens têm nome, idade e até jeito de ser – tal qual o Second Life, o mundo virtual que faz sucesso há mais tempo entre os adultos.

Gabriela e Juliana: elas marcam hora com os amigos para brincar on-line

Dessa nova leva de sites infantis, uma pesquisa mostra que o mais freqüentado por crianças do Brasil e de vários outros países é o Club Penguin, da Disney, uma cidade de pingüins cujo total de "habitantes" já é semelhante ao de metrópoles como Mumbai, na Índia: são 12 milhões de espécimes, a quem dão vida crianças de cinco continentes. Em paisagens pontuadas por lagos e montanhas nevadas, elas brincam de pescar, fazem campeonatos de bola de neve e praticam esqui, o esporte nacional do clube. O que as crianças afirmam ser mais divertido, no entanto, é a sensação de passar por situações típicas do mundo adulto, caso das amigas Gabriela Carlete e Juliana Bolletta, ambas de 10 anos: elas arranjaram emprego, escreveram para o jornal Penguin Times e têm dinheiro (em suas carteiras virtuais) para gastar – tudo em companhia de uma turma de amigos, que marca hora e lugar para navegar no tal clube.

Brinquedos em geral incentivam as crianças a simular situações da vida adulta, mas o que esses têm de diferente em relação aos convencionais é que nenhum outro proporciona uma interação tão completa. Desse ponto de vista, afirmam os especialistas, eles são uma boa novidade. Diz a psicóloga Ceres Araujo: "Nos mundos virtuais, as crianças não só fazem escolhas, a exemplo do que ocorre com qualquer outra brincadeira, como ainda vivenciam as conseqüências delas". No clube dos pingüins, por exemplo, elas acumulam dinheiro virtual para gastar, mas sabem que a poupança vai minguar caso decidam conferir luxos ao iglu onde moram, como lhe dar a forma de um aquário. Ao adotarem um animal, outra das brincadeiras do clube, terão de alimentá-lo bem – com excesso de chiclete, eles ficarão mais fracos. Em outro site de sucesso do gênero, o Neopets, quem descuida de seu animal de estimação sofre decepção ainda maior: ele permanece temporariamente fora da brincadeira. Avalia a professora Andréa Nolf, do Núcleo de Pesquisa de Psicologia em Informática da PUC de São Paulo: "Os novos mundos virtuais para crianças têm o mérito de ajudar a desenvolver um senso de responsabilidade – e são ótima fonte de diversão".

Na foto ao lado, Thomas e a mãe, Simone, navegam juntos na internet: "O computador é o meu melhor brinquedo".

Ela e outros estudiosos fazem, no entanto, algumas ressalvas com base no que já foi pesquisado. A primeira é que esse gênero de site infantil, que se presta ao lazer, não deve consumir mais do que uma hora do dia de uma criança. A razão é simples: ela precisa preservar o tempo livre para brincar com outras crianças – longe do computador. Isso nem sempre acontece. Outro ponto fundamental em relação a esses mundos virtuais é que algumas de suas ferramentas ajudam, de fato, a tornar a navegação mais segura. Entre elas os especialistas apontam os filtros de segurança programados para vetar a circulação na rede de palavrões e informações pessoais, além das equipes de monitores de plantão para flagrar diálogos suspeitos – e eventualmente expulsar do clube os que extrapolam os limites da boa convivência.

São todas ferramentas úteis, mas nenhuma delas substitui o papel dos pais de orientar os filhos sobre como fazer bom uso da internet. Desse gigantesco banco de dados, a maior parte não interessa às crianças (e muitas vezes a ninguém mais). No entanto, o restante pode lhes abrir um mundo de informações úteis e bom lazer. Ajudar as crianças a separar a parte boa do lixo que trafega na rede é certamente papel dos adultos. Funciona assim na casa de Thomas Tangerino, de 7 anos, e tem dado certo. O menino obedece a um conjunto de regras em casa: só entra na internet depois de feitas as tarefas escolares, não passa mais do que uma hora em frente ao computador e freqüentemente tem a seu lado a mãe, a psicóloga Simone Tangerino. Juntos, eles descobriram na internet vários dos sites infantis que tanto atraem Thomas e as crianças de sua geração. Sim, todos adoram o Club Penguin e descrevem com entusiasmo suas aventuras na internet. Resume Thomas: "Não consigo imaginar como era antes, no tempo dos meus pais, sem um brinquedo tão legal quanto o meu computador".

Proteção na rede

Novos universos virtuais para crianças, como o Club Penguin, vêm com ferramentas para tornar a navegação mais segura. Os especialistas afirmam que elas ajudam, mas que ainda assim os pais precisam orientar os filhos sobre como fazer bom uso da internet. Eis as ferramentas mais eficientes:

MONITORES ON-LINE
Equipes ficam de plantão para interceptar ofensas, palavrões e diálogos suspeitos. Tudo é gravado. O castigo para os participantes "infratores" é a suspensão temporária ou mesmo a expulsão do jogo

FILTROS DE CONTEÚDO
São softwares programados para impedir que obscenidades, xingamentos e informações pessoais (como números de telefone ou de cartão de crédito) circulem pelos sites infantis

BATE-PAPO LIMITADO
A ferramenta oferece a opção de restringir as conversas no mundo virtual a um menu fixo de códigos e frases. Diminui com isso a possibilidade de a criança engatar diálogos inapropriados

O que os pais podem fazer:
• Orientar as crianças a só interagir no mundo virtual com pessoas conhecidas
• Instruí-las a não compartilhar com ninguém a senha pessoal para o ingresso nesse tipo de site.


Escrito por Camila Pereira, para a Revista Veja.

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