Orquestras ganham versões on-line para fazer apresentações no mundo virtual. No entanto, ainda existem obstáculos técnicos e conceituais para esses shows.
O pessoal realmente se veste bem para ir aos concertos por aqui. Um homem ostenta um terno púrpura claro, com chapéu e patins combinando. Uma mulher usa um vestido que parece feito de penas de pavão e uma enorme borboleta azul voa suavemente em círculos a sua volta.
Técnico divulgava conteúdo no ‘Second Life’, enquanto a Filarmônica
Real de Liverpool tocava na última sexta-feira
Real de Liverpool tocava na última sexta-feira
Não estamos mais em Kansas, nem em Liverpool, na Inglaterra, onde a Orquestra Filarmônica Real de Liverpool abriu a temporada na sexta-feira (14) à noite. Para a ocasião, a orquestra chegou ao raro extremo de construir uma nova sala: um ambiente virtual no mundo on-line do "Second Life". Em réplica virtual da sala art deco, um público de figuras de animação, conhecidas como avatares, assistia à apresentação da orquestra ao vivo em um vídeo transmitido pela internet em uma tela na frente da sala.
Há quem ache futurista ou que não passe de empolgação, mas o fato é que o "Second Life" está atraindo cada vez mais atenção, e a música clássica está começando a participar desse movimento. A Universal Classics criou uma ilha on-line onde os visitantes podem dar uma olhada na réplica da exposição de artefatos da lendária mezzo-soprano Maria Malibran, em mostra itinerária pela Europa, para divulgar o novo álbum de Cecilia Bártoli em homenagem a Malibran.
Em maio, o pianista Lang Lang, em forma de avatar, fez um show ao vivo. E a filarmônica de Liverpool foi a terceira orquestra a oferecer um concerto ao vivo no "Second Life" neste ano, depois da Sinfonia Leeds, um grupo amador da Inglaterra e da Red, orquestra de câmara de Cleveland.
Alternativas
Existem obstáculos técnicos e conceituais ao observar personagens animados tocando música ao vivo em um mundo virtual. Um vídeo do YouTube, que mostra um pianista holandês tocando a sonata "Pathetique" de Beethoven em “Second Life”, ilustra alguns dos problemas: a apresentação é ótima, mas os dedos do personagem ficam indistintos nas teclas do piano.
"É uma mídia estranha", disse John Shibley, diretor de aprendizagem organizacional da empresa de consultoria EmcArts, que ajudou a gerenciar a apresentação da Red. "É meio como escutar ao rádio e assistir a um show de marionetes, só que o show não está sincronizado com o rádio".
Cada uma das três orquestras que se apresentaram nesse formato até agora adotou um método diferente. A Leeds apresentou um movimento de áudio ao vivo, com uma pequena orquestra gesticulando os avatares. A Red reproduziu o equivalente a uma transmissão pela televisão. A Liverpool optou por uma solução mais barata: uma câmera única e estática.
Essa abordagem, embora deselegante, talvez tenha sido a mais funcional. O diretor da Red, John Farina, estimou que se a orquestra não tivesse contado com diversos serviços voluntários, o evento teria custado cerca de US$ 200 mil. A orquestra ficou com uma fita de transmissão de qualidade profissional que, devido às restrições no contrato com os músicos, não poderá retransmitir.
A Liverpool, ao contrário, pagou apenas cerca de US$ 16 mil, sendo que US$ 6 mil dessa quantia foram destinados à compra de “sims” onde a sala de concertos foi construída (um "sim" é uma unidade de terra no "Second Life"). A orquestra também tem a vantagem de um novo contrato com seus músicos relacionado à potencial compra de participação nos direitos de transmissão.
"Podemos usar qualquer material da forma que quisermos", disse Millicent Jones, diretor executivo de marketing e comunicação da orquestra, que já se prepara para futuras apresentações em "Second Life".
Limitações
Sem dúvida existem limitações para a experiência de um concerto no "Second Life". Um "sim" é capaz de suportar apenas de 50 a 70 avatares sem problemas. Assim, ainda que a Liverpool tenha construído sua sala em dois "sims" e transmitido o concerto para outros locais de "Second Life", ela teve um público relativamente pequeno.
Além disso, como qualquer transmissão pela internet, a qualidade da transmissão depende da conexão. Ao assistir a Liverpool para a produção dessa reportagem, o som estava tão distorcido que a preleção feita antes do concerto ficou totalmente ininteligível; a soprano, Kate Royal, soava como se estivesse fazendo um dueto consigo mesma em "Sheherazade", de Ravel. Foi impossível apreciar a música, que incluiu estréias mundiais de Kenneth Hesketh e John McCabe.
Outros ouvintes disseram que a conexão estava boa. Em seguida, o público que foi para a confraternização no bar para beber drinks virtuais e participar da sessão de perguntas e respostas com o regente, Vasily Petrenko, parecia ter adorado tudo, talvez tanto a música quanto a experiência em si. "A música clássica não é muito acessível onde moro, então eu adorei", declarou um usuário cujo nome no "Second Life" é Nobody Fugazi.
Curiosidade
Apesar das previsões de que mundos virtuais prevalecerão cada vez mais, a tecnologia do "Second Life" está engatinhando. Seja dentro ou fora do universo da música clássica, discute-se se isso representa um admirável mundo novo ou simplesmente uma curiosidade.
"Ainda está na fase da curiosidade e empolgação", disse o regente Michael Tilson Thomas, embora ele conheça pessoalmente o grupo do Linden Labs, que inventou o site, e seja fã do romance "Snow Crash", de Neal Stephenson, que o inspirou. Ele e o Linden Labs, disse, estão "chegando às fases de negociação de um novo projeto".
Jonathan Gruber, vice-presidente de novas mídias da Universal Music Group, disse: "Não estamos dominando 100%. É experimental. Queremos ter certeza de que se houver oportunidades para alcançarmos as pessoas através de uma mídia como o 'Second Life', não ficaremos para trás". A mídia pode ser de última geração, mas os gostos continuam bastante conservadores. Alguns ouvintes reagiram com perplexidade à exuberante peça de Hesketh, e houve quem a chamasse de "apenas barulho".
Dave Schwartz, fundador da Music Academy Online, onde organiza pequenas sessões de música, sonha em levar a música clássica a um público mais abrangente criando uma "Disney World de música clássica" em "Second Life". Mas Schwartz também está tentando levar músicas mais novas para esse ambiente. "Você ainda não escutou 'Poeme Electronique'", disse ele, referindo-se à peça de Edgard Varese, "se não a escutou pela internet em um mundo virtual".
Texto e fotos: G1 . The New York Times
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