sexta-feira, 7 de setembro de 2007

Revista Veja usa o Second Life como paródia sobre as últimas ações do PT

Abordagem irônica e bem humorada da publicação, nas bancas a partir de hoje, trata o Congresso do PT como "coisa do mundo virtual", pelas suas "idéias delirantes e pela tese de que o mensalão não existiu".

"A Second Life do petismo"

O Partido dos Trabalhadores está vivendo um momento, digamos, Second Life, aquela brincadeira da internet em que as pessoas criam para si mesmas avatares com as qualidades que elas não possuem na vida real. Em sua Second Life, o PT é um partido ético, suas lideranças estão acima de qualquer suspeita e suas propostas têm legitimidade para resolver os grandes problemas do país. O avatar José Dirceu é saudado como o herói que volta de renhida batalha e os deputados acusados de corrupção são vítimas de uma grande conspiração, um certo "mensalão", que nunca existiu. O PT virtual pensa no futuro com magnanimidade, admitindo até apoiar um candidato de outro partido para a sucessão presidencial.

"Numa realidade apenas virtual, o PT quer reestatizar
empresas privadas, acabar com o Senado e implantar o
"socialismo sustentável". Na real, o objetivo é ter mais poder"


No 3º Congresso Nacional do partido, encerrado na semana passada, em São Paulo, a vida vicária dos petistas atingiu seu delírio máximo. Criou-se ali um ambiente imaginário em que se aclamam virtudes que não existem e se aniquilam problemas que podem trazer algum tipo de constrangimento. No avatar petista, o passado recente foi expurgado e as perspectivas de futuro construídas em cima de teses delirantes, como a reestatização de empresas, a convocação de uma assembléia constituinte para fazer a reforma política e a extinção do Senado. Foram três dias de debates em que o petismo tentou recriar a realidade. Parecia a tela de um computador.

O congresso do PT aconteceu na mesma semana em que o Supremo Tribunal Federal decidiu aceitar a denúncia contra os quarenta acusados de integrar a maior e a mais bem organizada quadrilha já descoberta agindo na estrutura de governo. Como se sabe, entre os acusados, nove tinham posição de destaque no PT. O deputado José Genoíno, processado por corrupção ativa e formação de quadrilha, era o presidente do partido. Além dele, foram denunciados o ex-tesoureiro Delúbio Soares, o ex-secretário Silvio Pereira, o ex-ministro Luiz Gushiken, o ex-deputado José Dirceu, Professor Luizinho e João Magno e os deputados João Paulo Cunha e Paulo Rocha.

Enquanto isso, na vida real...

O Brasil esperava que o partido, constrangido, no mínimo anunciasse alguma medida contra a corrupção. Mas o PT, como resposta, decidiu apenas adotar um código de ética para seus filiados, ainda assim somente a partir do ano que vem. Ética pode esperar. Até o presidente Lula incorporou seu avatar e deixou registrada uma contribuição para reforçar a fantasia petista sobre os mensaleiros: "Sabemos que alguns companheiros nossos foram indiciados pela Suprema Corte. Mas eu queria que os petistas tivessem em mente uma coisa: até agora nenhum deles foi inocentado, mas também nenhum deles foi culpado. É verdade que podemos ter cometido erros, e os erros estão sendo apurados como precisam ser. Ninguém neste país tem mais autoridade moral e ética do que nosso partido". O que Lula quis dizer? Para o mundo real do petismo, foi uma moção de apoio aos mensaleiros. Parece mesmo, mas também foi virtual.

No campo eleitoral, o mundo virtual petista também colocou em curso uma realidade de faz-de-conta. O partido aprovou uma proposta na qual admite abrir mão da candidatura própria à Presidência da República em benefício de aliados, como Ciro Gomes, do PSB. É outra fantasia travestida de nobreza. O PT quer sim ter seu próprio candidato à sucessão de Lula. O problema é a falta de uma liderança. Nomes apontados como possíveis sucessores de Lula, candidatos em potencial a governador, senador ou prefeito de capital, caíram em desgraça e saíram do jogo político. No mensalão, ou "erro", como os petistas preferem, naufragaram José Dirceu, José Genoíno e João Paulo Cunha. Ao quebrar o sigilo bancário do caseiro Francenildo Costa, o ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci se inviabilizou. Na compra do dossiê contra os tucanos na eleição de 2006, Aloizio Mercadante e Ricardo Berzoini foram atingidos. Já neste ano, Marta Suplicy e Marco Aurélio Garcia sucumbiram à crise aérea. A primeira ao aconselhar os passageiros a "relaxar e gozar" nas longas esperas nos aeroportos. O segundo pelo famoso "top, top, top".

Na semana passada, ao comentar algumas das decisões do congresso do partido, Lula, desta vez no mundo real, admitiu que o PT jogou para a platéia. Segundo o presidente, o plebiscito para a reestatização da Vale do Rio Doce era uma maneira de fazer média com os movimentos sociais historicamente ligados ao partido. Ele garantiu que o governo não quer a reestatização nem pretende discutir a idéia. Para quem ainda não compreendeu, no mundo ideal o PT se diz um partido de esquerda, preocupado com as injustiças sociais, cioso da ética e empenhado em implantar o "socialismo sustentável", seja lá o que isso queira dizer. No mundo real, o PT tornou-se uma agremiação política como outra qualquer, estrelado por deputados acusados de corrupção e ocupados apenas com um objetivo: conquistar e manter o poder, se preciso à custa de reinventar a realidade.

Escrito por Otávio Cabral, para a Revista Veja

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